sexta-feira, 22 de abril de 2011

Somewhere Over The Rainbow

Foi ao final de mais um dia “rotineiro” de obrigações. Quando voltava pra casa, depois de uma “agradável” viagem de busão lotado, com direito a “baculejo policial.” Rá.

Não sabia definir exatamente o que sentia, mas precisava o quanto antes chegar em casa.
Era como se algo quisesse sair de dentro de si. Parecia que estava sendo estrangulada, pois o ar muito lhe faltava naquelas horas.
Por vezes sentiu vontade de gritar, só para ver se aliviava toda aquela tensão. Mas não podia, ou o vexame a deixaria ainda pior. Queria naquele momento apenas chegar em casa para então recolher-se em seu quarto.Seu refúgio.

Chegou; e cansada e atormentada correu para o quarto com um único intuito:
Abrir a janela do quarto e sentir no rosto aquele ventinho frio de começo de noite.
E assim o fez. Fazia tempo que não abria aquela janela.
E logo pôde ouvir, mesmo que baixinho a música que vinha da casa ao lado.
É claro, logo reconheceu aquela voz.
Pois a ouviu por todas as manhãs de sua infância, no carro do pai, a caminho da escola.
Era Roberto, cantando pra ela naquela noite...
“É preciso saber viver, é preciso saber viver. É preciso saber viver. Saber viver. Saber viverrrr, ei, iiiêii. ”
Ela então respirou fundo. Tão profundo quanto pôde, e chorou.
Naquele momento permitiu-se então, chorar. Era isso o que precisava.
Chorou como se estivesse perdido um parente querido, um amigo, não sei.
De fato, ela havia perdido. E por isso chorava. Chorava de alegria.
Não era a primeira vez que chorava uma perda. Contudo, era a primeira vez que se sentia alegre por isso.
Ela havia perdido o que não gostaria nunca de ter encontrado.
Ela havia perdido os sentimentos menos nobres que alguém gostaria de ter (medo, tristeza, solidão, mágoa, etc.), mas que de forma alguma conseguia expeli-los de dentro de si.
Enganou-se por muitas vezes. Pois em muitas destas, pensou que eles já não existissem mais.
Tudo ilusão. De tempo a tempo eles reacendiam dentro dela como se precisassem  lembrá-la de que eles ainda estavam lá.
Ela não os queria dentro de si mas não sabia o que fazer para retirá-los tão logo quanto pudesse de sua vida.
Mas naquele dia, aconteceu.
Não era um dia especial, nenhum acontecimento esperado ou inesperado poderia ter acontecido para deixá-la naquele estado de tamanha euforia.
Mas algo sem dúvida havia mudado. Não no mundo exterior onde andou vagando por um tempo, e sim dentro dela.
Há tempos, não muito distantes. Cansada de lutar contra os “tais sentimentos indesejados”
Ela decidiu sair do seu casulo. Arrumou as malas e levou consigo apenas os sentimentos mais nobres, os poucos que ainda lhe restavam.
Saiu rumo ao mundo exterior, onde as coisas realmente acontecem e onde o tempo...Hum, não pára.
Foram dias difíceis estes em que esteve fora. Fora de si, digo.
Mas ela realmente precisa sair de si, à procura daquele sorriso, que já não era o mesmo de antes. Aquele no qual só os amigos verdadeiros sabiam descrever.
Queria de volta também seus olhos.
Que apesar de ainda manterem sua bela cor-de-mel,  já não tinham o mesmo brilho de antes.
Há tempos que já não era mais a mesma.
Risonha, tagarela, aquela que era conhecida como a “palhaça das amigas.”
Ao contrário disto, havia se tornado lacônica. De meias, poucas, e tortas palavras. Daquelas que saem pelo canto da boca, sem nem mesmo enrijecer um músculo da face. (E olha, que  ela nunca teve um AVC tampouco ousou usar botox. A idade ainda não lhe apontou tais debilidades e necessidades). Rá!
E foi para longe do seu pequeno e chulo mundinho interior.
Passou a observar, e como diz o RAPPA: “E só observar...”
Afinal, esta ainda era uma forte característica sua. A observação.
Observou tudo. E viu a vida nos seus mais íntimos detalhes.
Viu beleza nas flores. Sentiu a brisa do mar. O céu branquinho de uma bela tarde. O saboroso gosto do pão quentinho de todas as manhãs. Sorrisos de crianças. Viu fotos de sua infância e adolescência. Sentiu o abraço sincero Da família. Viu ternura no telefonema de um amigo. Viu vontade de viver na enfermidade de um pequenino ser. Recebeu o amor incondicional de um animal. Viu e sentiu um novo sonho profissional nascer. Viu também o nascimento de novas amizades. Viu olhares desejosos em sua direção. Viu o amor dos amigos quando lhe fizeram uma surpresa deaniversário.
Viu até mesmo o grande aprendizado adquirido com experiências passadas.
E estava tudo ali, diante de deus olhos que de tão cega que estavam não podiam enxergar tamanhas preciosidades.
E então agradeceu a Deus, sim a Deus, aquele o qual na bonança o expulsou de sua vida.Agradeceu pela oportunidade maravilhosa de poder viver e presenciar tudo isso.
Foi então que percebeu que já estava voltando para dentro de si. E já não trazia consigo aqueles sentimentos negativos de outrora. Mas um coração puro novamente.
Sem mágoas, sem raiva, sem rancor.
Trazia apenas um coração livre e uma sensação interior boa que há tempos não sentia.
Paz de espírito.

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"...Oh, Somewhere over the rainbow way up high
And the dream that you dare to, why, oh why can't I? "